terça-feira, 14 de maio de 2013

SIMULAÇÃO: Réplica Município



TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE LISBOA

Processo N.º 13


Exmo. Sr. Juiz de Direito
Do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa,

A Sociedade Lislixo, S.A., NIPC 123 123 123, com sede na Rua Patrocínio, Nº 111, 2715-311, Lisboa,

Em coligação com,

A Associação Ambientalista Verdetotal, NIPC 987 987 987, com sede na Rua Monte Olivete, Nº 35, 1200-278, Lisboa,

Na acção administrativa comum movida contra,

O Município de Lisboa, Paços do Concelho – Praça do Município, 1149 – 014, Lisboa,

Vem deduzir RÉPLICA, o que faz nos termos do Art. 502º, nº 1 do Código de Processo Civil, ex vi do Art. 42º, nº 1 do Código de Procedimento dos Tribunais Administrativos, e com os seguintes fundamentos:

I-                   DA EXCEPÇÃO

   a)      Da impugnação do contrato de concessão


Nos articulados 4.º a 6.º da douta contestação vem o Réu impugnar o contrato apresentado pelo autor na petição inicial;


Com fundamento numa invalidade verificada por a entidade pública não ser o primeiro outorgante no contrato;


Não existindo base legal que fundamente este facto ou ainda menos que o comine com uma sanção jurídica que permita a alteração ao contrato, não percebe o Autor como uma mera irregularidade poderia dar lugar à invalidação do contrato.


Ademais, mesmo que se considerasse o contrato inválido por força da colocação do outorgante público em segundo lugar, tal nunca poderia fundamentar uma regularização em que houvesse lugar à inserção de uma nova cláusula contratual;


Cláusula esta que é a única que apoia o pedido reconvencional deduzido pelo Réu;


Desta forma, o contrato efectivamente celebrado pelas partes é o contrato que consta como anexo da petição inicial com a correcção de o outorgante público aparecer como primeiro outorgante e não o contrato com a nova cláusula que o Réu, em plena litigância de má-fé, lhe quis inserir;

   b)      Da veracidade das tabelas invocadas pelo A.
No artigo 10.º da douta contestação, o Réu impugna a veracidade das tabelas anexadas à petição inicial que comprovam a diminuição da quantidade de resíduos recolhidos e dos lucros da sociedade Lislixo, S.A.;


Afirmando num tom claramente irónico que “até um leigo em computadores conseguia fazer uma tabela do género”;


Na verdade, estas tabelas foram efectuadas por leigos em computadores mas especialistas em contabilidade, com os quais a sociedade Lislixo, S.A. colabora [doc. Anexo 1];


   c)      Da localização das imagens apresentadas pelo A.


10º

Vem igualmente, numa continuada atitude de litigância de má-fé, no articulado 16.º da douta contestação, o Réu afirmar que não se percebe se as imagens apresentadas são da cidade de Lisboa e não da Região Autónoma dos Açores;

11º

As fotos apresentadas pelo Autor são aquelas em que se verifica uma maior acumulação de resíduos;


12º

No entanto, vem o Autor apresentar novas fotografias a juízo, as quais são tiradas indubitavelmente, na cidade de Lisboa [doc. Anexo 2];


   d)      Do carácter unitário da retribuição da Concessionária

13º

O R. invoca, no articulado 12º da sua contestação, que a retribuição pelo serviço concessionado é fixa, nos termos da cláusula 19º do contrato de concessão.

14º

Ora, sendo que esta cláusula foi adicionada pelo R. numa suposta regularização (a que aludimos supra) e a qual não consideramos válida, não pode esta ser atendida para efeitos de determinação da remuneração.

15º

Acresce que, sendo que o objecto do contrato passa pela gestão dos resíduos pela entidade concessionária, cabe a esta determinar a forma como esta gestão será feita.

16º

Deste modo, apesar de não estar contratualmente estipulado o modo de gestão dos resíduos, a mesma é feita com o tratamento dos resíduos e posterior venda dos resíduos tratados.

17º

É destas vendas que advêm os principais lucros do A..  Foi aliás, com base nestes lucros que foi celebrado o contrato de concessão.

18º

Relembramos, aliás, que inerente ao próprio conceito de concessão está a assumpção de risco pelas partes. Sem a variabibilidade da remuneração esta alia estaria em causa, e descaracterizaria-se a concessão.

   e)      Do conceito de exclusividade

19º

Face às considerações do R.  no ponto 13º da Contestação cumpre relembrar as afirmações da A. na Petição Inicial.

20º

Assim, no ponto 19 da referida Petição, temos que: “Tais perdas colocam a empresa numa situação bastante débil, uma vez que a sua situação económico-financeira depende única e exclusivamente do contrato celebrado com o Município de Lisboa, o seu único “cliente””.

21º

A A. refere assim que o Município de Lisboa se assume como seu único cliente, não em função do conceito de contrato de exclusividade entre com o mesmo celebrado, mas em função da actividade exercida pela A., a qual não é objecto de elevada procura na área de Lisboa (compreensivelmente…), onde a desenvolve.

22º

Não foi, por isso, por referência  ao contrato em regime de exclusividade celebrado com o Município que a A. fez tais afirmações, até porque deste decorre , tão-somente, “a obrigação para o concedente de não consentir a mais ninguém o exercício da actividade que haja objecto da concessão” (Vd., a este propósito, MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, vol. II, 10ª edição, 1980, p. 1121)

f)       Da legitimidade do Município para estar em juízo

23º

O R. alegam nos articulados 23º a 26º da contestação que o Município de Lisboa só será parte legítima no respectivo processo por força do nº 2 do artigo 10º do CPTA. Ora, como decerto é do conhecimento do R., a regra do nº2 do art. 10º vem concretizar a regra geral no nº1, não fundamentando um critério autónomo de  aferição da legitimidade.

24º

A A. limitou-se, sim, a enunciar os factos (a situação de o Município ser o seu único cliente), como elemento argumentativo para a causalidade entre os furtos ocorridos e a débil situação financeira da Sociedade.


   g)      Do incumprimento contratual e da reconvenção

25º

O R., nos pontos 43º a 49º da Contestação, afirma que a A. incumpriu os seus deveres contratuais, visto que “era obrigação da concessionária adoptar as medidas necessárias, no âmbito da concessão, que colocassem termo à situação fáctica descrita” (ponto 44º).

26º

Como referido supra, o contrato que regula a relação contratual entre a A. e o Município não é o alegado pelo R., não existindo nenhum dever contratual que o imponha à A.

27º

Mais, os deveres de fiscalização por parte do Município derivam da lei, como referido na Petição Inicial apresentada pela A. neste Tribunal (cfr. pontos 47º a 62º), sendo desnecessária a sua previsão no contrato.

28º

Nem se percebe o apelo à citação de PEDRO GONÇALVES, “A entidade pública contratante não pode exigir prestações contratuais desproporcionadas ou que não tenham uma relação directa com o objecto do contrato (Cfr. Pedro Gonçalves apud Carla Amado Gomes, Risco e Modificação do Acto Autorizativo Concretizador de Deveres de Protecção do Ambiente, FDUL, 2006, p. 774)”, visto que esta, a ter alguma relevância, seria a favor da argumentação da A..

29º

Na verdade, o R. exige uma prestação contratualmente desproporcionada, que nem sequer está prevista no contrato e não tem nenhuma relação com o seu objecto.

30º

Desta forma, os deveres de fiscalização da actividade continuam a pertencer ao Município.

31º

Nesta medida, não consideramos procedente o pedido de indemnização formulado pelo R. (ponto 55º da Contestação), visto que não impendem sobre a A. quaisquers deveres contratuais que possam ser violados, logo a mesma não pode ser responsabilizada pela sua violação.

32º

De seguida (pontos 50º a 56º), o R. afirma que perdeu o interesse na prestação, visto que: 1) há omissão de deveres contratuais; 2) a não recolha por parte da A. dos resíduos conforme o estipulado cria perigos para o ambiente; 3) a renumeração é, agora, manifestamente desproporcionada, tendo o Município resolvido o contrato com base no art. 333º/1, alínea a) do CCP. Vejamos com atenção estes argumentos.

33º

Na execução dos contratos administrativos não só estão em causa meros interesses privados, mas também o interesse público. Mesmo quando a Administração Pública escolhe a forma de contrato administrativo para actuar, não deixa de existir uma prossecução do interesse público: um “interesse público contratualizado”.

34º

Deste modo, a lógica do pacto não pode ser incondicional, i.e., não pode haver uma absoluta paridade das partes, sendo por isso imperativa a manutenção de certos poderes de autoridade pelo contraente público.

35º

Justifica-se, portanto, que a Administração possa adoptar actos administrativos na fase de execução do contrato (os chamados actos administrativos contratuais), pois “a actuação por acto administrativo deve existir (e estar legalmente prevista) para assegurar a permanente e eficaz disponibilidade administrativa do interesse público contratualizado (…)” (RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA, O acto administrativo contratual”, CJA, 63, 2007, p. 16-17).

36º

A resolução consubstancia “uma forma de extinção da relação contratual, por declaração unilateral de um dos contraentes, baseada num fundamento ocorrido posteriormente à celebração do contrato” (MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações, II, 7ª edição, 2010, pp. 104-105).

37º

Nos termos do artigo 307º/2-d) do Código dos Contratos Públicos (adiante: CCP) a resolução unilateral é feita pela adopção, por parte da Administração, do respectivo acto administrativo.

38º

Este acto administrativo contratual carece (na linha do que sucede no regime da resolução no direito civil), portanto, de fundamento legal ou contratual. No que concerne à lei, vem o CCP, nos artigos 302º/e) e 307º/2-d) admitir tal possibilidade, ainda que limitada a três fundamentos: situações de incumprimento, de alteração das circunstâncias ou de interesse público (333º a 335º CCP).
 
39º

Em primeiro lugar, o R.  alega, tão-só, a existência de um acto administrativo de resolução do contrato, sem fornecer qualquer prova do mesmo (cfr. ponto 56º da Contestação).

40º

Em segundo lugar, parece-nos que o R. não está a par do regime dos vários tipos de resolução de contratos administrativos. De facto, o R. invoca a favor da resolução sancionatória que “a forma de remuneração estabelecida ficar agora injustificada e manifestamente desproporcionada, havendo razões económico-financeiras e de interesse público que desaconselham a manutenção do contrato dado a inexistência, nos termos acordados, da contraprestação contratualizada” (ponto 53º).

41º

Ora, o facto da renumeração ser desproporcional à contraprestação nunca poderia justificar uma resolução sancionatória, mas apenas uma resolução por alteração das circunstâncias, visto que o desiquilíbrio contratual não pode ter como pressuposto a violação de deveres contratuais.

42º

Mas, mesmo que o R. alegasse a resolução por alteração das circunstâncias, o argumento não procederia, visto que o equilíbrio contratual se mantém desde o início do contrato. Um incumprimento do contrato (o qual não se verifica, in casu) não é fundamento que ponha em causa o equilíbrio contratual, o que apenas sucederia por força de um facto externo às partes.

43º

A favor disto, vejam-se as considerações tecidas por CARLA AMADO GOMES: “A alteração das circunstâncias (…) deriva de uma causa objectiva, externa às partes, imprevisível, que torna a manutenção da relação contratual insustentável nos termos inicialmente previstos devido à excessiva onerosidade que provoca para o adjudicatário” (A conformação da relação contratual no Código dos Contratos Públicos”, 2008, p. 16).

44º

Ademais, são invocadas “razões de interesse público” como fundamento da resolução sancionatória, as quais poderão justificar uma resolução por interesse público, mas nunca a  resolução que o R. alega ter realizado.

45º

De facto, a invocação de MENEZES CORDEIRO a favor da sua posição não pode ser aceite, visto que quando refere que “a sujeição a um interesse público opera como justificação para que uma das partes possa, unilateralmente, introduzir modificações no contrato” (Cfr. MENEZES CORDEIRO, “Contratos públicos: subsídios para a dogmática administrativa com exemplo no princípio do equilíbrio financeiro”, in O Direito, 2, 2007, pp. 47-48), o A. refere-se à modificação do contrato e não à sua resolução, e, além disso, afirma-o considerando como fundamento dessa modificação o interesse público e não a violação de deveres contratuais.

46º

Contudo, mesmo a resolução por interesse público não seria, in casu, admissível. O fundamento da possibilidade de resolução por interesse público passa pela necessidade de “evitar males maiores do que os já produzidos pela dificuldade ou impossibilidade de cumprimento do pactuado” (MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, I, 10ª edição, 1980, pp. 637-638).

47º

O interesse público, «há-de, em primeiro lugar, tratar-se naturalmente de casos imperiosos, seja pela dimensão dos eventos, seja pela importância do interesse público envolvido, não podendo servir como tal nem o comportamento do contratante particular, nem as desvantagens económicas (para a Administração) do contrato». (PEDRO GONÇALVES, O Contrato Administrativo, 2003, p. 133).

48º

Esta passagem de PEDRO GONÇALVES demonstra bem que não poderia existir fundamento para a resolução por interesse público, visto que o R. alega que o “hipotético interesse público” deriva da falta do cumprimento dos deveres contratuais por parte da A., deveres estes que são inexistentes!

49º

No que concerne à resolução por incumprimento, é preciso realçar que “incumbe ao co-contratante a exacta e pontual execução das prestações contratuais” (art. 288º CCP).

50º

Em princípio, “(…) a resolução fundada em incumprimento do contrato pressupõe um incumprimento definitivo, o qual, em regra, só se alcança após a notificação do co-contratante para cumprir”. (PEDRO GONÇALVES, Cumprimento e Incumprimento do Contrato Administrativo, Estudos de Contratação Pública, I, 2008, p. 608-609).

51º

Mas, para além da regra geral, é verdade que se pode alcançar o incumprimento definitivo sem a respectiva interpelação, nomeadamente quando o credor perde o interesse na prestação ou quando esta se torna impossível, sendo este o fundamento invocado pelo R. para a respectiva resolução.

52º

No caso concreto, é impossível sustentar a perda de interesse na prestação por parte do R.. Para que tal sucedesse, seria necessário que a prestação não mais satisfizesse o interesse do credor, i.e., que este já não retirasse nenhuma utilidade da mesma.

53º

Assim, fica por demonstrar que o R. deixou de necessitar da prestação da A.. De facto, o alegado incumprimento contratual não é fundamento bastante, in casu, para sustentar uma perda de interesse por parte do credor, visto que este continuará a necessitar sempre de uma entidade que exerça a actividade de gestão de resíduos.

54º

Desta forma, não procede a argumentação relativa à perda do interesse na prestação.

   h)     Do perito

55º

No que concerne ao argumento deduzido no articulado 54º da sua contestação, pensamos que o mesmo só pode ser expressão de um grande equívoco por parte do R.. De facto, não vemos como tal conclusão possa advir da interpretação do artigo 390º do Código das Sociedades Comerciais.

56º

De qualquer forma, não encontramos qualquer base legal que fundamente a posição arguida nesse articulado, pelo que a mesma não pode proceder.

57º

II – DO PEDIDO:

   1)     Considera-se improcedente o pedido de indemnização formulado pelo R., pelos fundamentos acima indicados (pontos 25 a 31);
   2)     Assim também, temos por improcedente a argumentação deduzida em favor da resolução do contrato em causa, dado que a mesma não existe (pontos 32 a 53).



JUNTA: DUC, comprovativo de pagamento da taxa de justiça e dois documentos anexos.


P. D.

Lisboa, 14 de Maio de 2013

O Advogado.

Daniel Bogalheiro
Diana Nunes
Inês Mateus
Isabel Ferreira
João Maltez
Marisa Silva
Miguel Vieira
Luís Aragão
Patrícia Domingos
Vera Martins

No link seguem os anexos relevantes: 





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