sábado, 20 de abril de 2013

SIMULAÇÃO: Petição Inicial



TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE LISBOA





Exmo. Sr. Juiz de Direito do Tribunal
Administrativo de Círculo de Lisboa,


A Sociedade Lislixo, S.A., NIPC 123 123 123, com sede na Rua Patrocínio, Nº 111, 2715-311, Lisboa,

Em coligação com,

A Associação Ambientalista Verdetotal, NIPC 987 987 987, com rede na Rua Monte Olivete, Nº 35, 1200-278, Lisboa,

Vem propor acção administrativa comum contra,

O Município de Lisboa, Paços do Concelho – Praça do Município, 1149 – 014, Lisboa,

A Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e de Resíduos, I.P., com sede no Centro Empresarial Torres de Lisboa, Rua Tomás da Fonseca, Torre G, 8º, 1600-209, Lisboa,

O Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, com sede em Praça do Comércio, 1149-010, Lisboa,

O que faz nos termos do art. 37º, nº 1, e nº 2, alínea c) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, doravante CPTA, e com os seguintes fundamentos:
I – DOS PRESSUPOSTOS DA ACÇÃO

Considera-se competente a jurisdição administrativa e fiscal nos termos do número 3 do art.º 212º da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP), e art.º 4.º, n.º 1, alíneas f) e l) do Estatuto dos Tribunais Administrativos Fiscais (doravante ETAF);

Tendo em conta que estamos perante uma situação de execução de um contrato administrativo, i.e., um contrato cujo regime substantivo se encontra regulado por normas de direito administrativo, a alínea f), do n.º 1 do art.º 4.º encontra-se preenchida;

Competente, também, nos termos da alínea l), do mesmo art.º 4.º/1 do ETAF, na medida em que estamos perante a apreciação de “actividades proibidas por normas de direito administrativo, que imponham à Administração o dever de prevenir e reprimir a respectiva violação” (MÁRIO AROSO ALMEIDA, Manual de Processo Administrativo, 2010, p. 173);

Quanto à sua competência territorial, a mesma verifica-se, nos termos dos arts. 16º e 19º CPTA, por ser o tribunal em questão o do lugar do cumprimento do contrato, e o da residência habitual dos Autores, respectivamente;

A «Sociedade Lislixo, S.A.» é parte legítima, nos termos do art. 9º, nº 1 CPTA, por ser parte na relação material controvertida, nomeadamente por haver celebrado um contrato de concessão de serviços públicos (Doc. Anexo 1) com o Município de Lisboa, nos termos do art. 407º nº2 do Código dos Contratos Públicos, doravante CCP;

A «Associação Ambientalista Verdetotal» é parte legítima nos termos do art. 9º, nº 2 CPTA, do art. 52º nº 3 da CRP e do art. 2º nº1 e 3º da Lei nº 83/95, de 31 de Agosto, que rege o Direito de Participação Procedimental e Acção Popular.

O Município de Lisboa é competente em matéria de gestão de resíduos urbanos e promoção do ambiente e saúde pública, segundo o consagrado nos arts. 13º, nº 1, alínea l), e 26º, nº 1, alínea c), da Lei nº 159/99, de 14 de Setembro, pelo que se considera parte legítima, nos termos do art. 10º, nº 1 CPTA, por ser parte na relação material controvertida;

Acresce ainda que o Município de Lisboa celebrou com a Sociedade Lislixo, S.A., um contrato de concessão de serviços públicos, nos termos do art. 407º, nº 2 do Código dos Contratos Públicos (doravante CCP), nos termos do qual a segunda se obrigou à gestão de resíduos sólidos urbanos, actividade de serviço público a cargo do referido município, sendo remunerada pelos resultados financeiros dessa gestão, pelo que, por virtude desse contrato, é igualmente parte na relação material controvertida, conforme resulta da aplicação do art. 10º, nº 1 do CPTA;

A Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e de Resíduos, I.P.(doravante ERSAR, I.P.), é competente em matéria de regulação das entidades gestoras de resíduos sólidos urbanos, cabendo-lhe também a promoção de uma política sustentável neste sector, e ainda a promoção do ambiente,  nos termos do art. 5º, nº 1, alínea c) e nº 2, alínea a), b), d) e j) do Decreto-Lei nº 277/2009, de 2 de Outubro, que aprova a orgânica da respectiva entidade, tendo assim legitimidade passiva nos termos do art. 10º, nº 1 CPTA, por ser parte na relação material controvertida;

10º
A Inspecção Geral do Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT), possui competência para decidir em questões de contra-ordenações ambientais, nos termos do art.2º, nº2, do Decreto-Lei nº 23/2012, de 1 de Fevereiro, que aprova a sua orgânica. Ora, atenta a regra do art. 10º, nº2, do CPTA, estando em causa a acção ou omissão de uma entidade pública, “deve ser demandada a pessoa colectiva de direito público ou , no caso do Estado, o ministério a cujos órgãos seja imputável o acto jurídico impugnado ou sobre cujos órgãos recaia o dever de praticar os actos jurídicos ou observar os comportamentos pretendidos”. Neste caso, considera-se parte legítima o Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (doravante MAMAOT), no qual se integra a IGAMAOT, nos termos do art. 1º do Decreto-Lei referido;

11º
A coligação é admissível, entre os vários Autores contra os vários Réus, pois apesar da diferença da causa de pedir, a procedência dos pedidos principais depende essencialmente da apreciação dos mesmos factos e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito, nos termos do art. 12º, nº 1, alínea b), do CPTA.


II – DOS FACTOS

12º
A Sociedade Lislixo, S.A. celebrou, no dia três de Dezembro de dois mil e nove, com o Município de Lisboa, um contrato de concessão de serviços em regime de exclusividade (Doc. Anexo 1);

13º
O objecto do contrato passava (e passa ainda) pela recolha e triagem dos resíduos sólidos urbanos da área concelhia de Lisboa;

14º
Em 2012, reportaram-se várias situações de desaparecimento de Resíduos Sólidos Urbanos (RSU) que se encontravam nos ecopontos da Sociedade Lislixo, S.A.;

15º
Verificou-se que estes desaparecimentos se deviam à recolha dos RSU por parte de sujeitos privados desconhecidos, que se antecipavam à passagem das viaturas de recolha da Sociedade Lislixo, S.A., a qual ocorre diariamente, entre as 23h e as 5h;

16º
Nos cálculos finais de recolha de RSU do ano de 2012, constatou-se uma diminuição de cerca de 40% (Doc. Anexo 2) em relação aos anos anteriores;

17º
Apesar da grave crise económica que o país atravessa, podemos verificar que, noutros concelhos (Doc. Anexo 3), a diminuição não foi tão acentuada, o que demonstra estarmos perante um problema local, a saber, o dos “catadores de lixo”.

18º
Como consequência desta situação, resultaram perdas significativas nos proventos económicos da Sociedade Lislixo, S.A., na ordem dos 33% (Doc. Anexo 4);

19º
Tais perdas colocam a empresa numa situação bastante débil, uma vez que a sua situação económico-financeira depende única e exclusivamente do contrato celebrado com o Município de Lisboa, o seu único “cliente”;

20º
Tornando-se assim extremamente difícil a execução de um serviço com tão elevados custos, pois a quebra verificada, para além de não permitir que a empresa atinga qualquer lucro decorrente sua actividade, revela-se igualmente insustentável o suporte das despesas com os funcionários e com a manutenção do equipamento técnico crucial;


21º
Para além dos graves prejuízos económicos, a actuação dos catadores de lixo prejudicou também o espaço circundante dos ecopontos, uma vez que o mesmo foi deixado em condições precárias (Doc. Anexo 5);

22º
Tais situações demonstraram-se prejudiciais para o ambiente e para a saúde pública da população (Doc. Anexo 6);

23º
As situações prejudiciais para o ambiente surgem, sobretudo, em virtude de os RSU serem removidos por sujeitos não conhecidos, pelos seus próprios meios e não pelos meios adequados e legalemente estabelecidos, não se sabendo qual o destino dado a estes resíduos;

24º
Por via desta remoção clandestina, verifica-se ainda uma acumulação de resíduos nas zonas circundantes aos ecopontos pertencentes à «Sociedade Lislixo, SA», a qual, para além de causar uma manifesta poluição em várias zonas da cidade, se mostra como propícia à criação e proliferação de doenças, causando graves perigos à saúde pública;

25º
Os dados respeitantes ao primeiro trimestre de 2013 evidenciam que a situação, não só se mantém, como se tem vindo a agravar (Doc. Anexo 2);

26º
Face a esta conjuntura, foram enviados vários requerimentos (Docs. Anexos 7, 8 e 9), quer ao Ministério do Ambiente, isto é, à IGMAOT, à ERSAR e ao Município de Lisboa.

27º
A estes requerimentos não obteve a sociedade qualquer tipo de resposta;

28º
Tendo a sociedade dirigido vários pedidos às entidades supra mencionadas, solicitando-se a sua intervenção de forma a por termo à situação assinalada, a sua inércia de resposta e actuação tem contribuído para um agravamento da situação, pelo que resta senão às autoras recorrer aos meios jurisdicionais.


III – DO DIREITO

a)     Do direito ao ambiente

29º
O ambiente é um bem constitucionalmente protegido, possuindo uma tutela objectiva, nos termos do art. 9º, alíneas d) e e), onde se estabelece, como uma das tarefas fundamentais do Estado, a protecção do ambiente, mas também uma tutela subjectiva, já que o art. 66º consagra o direito ao ambiente como um verdadeiro direito fundamental.

30º
O direito ao ambiente configura-se, no entanto, como um direito complexo, já que, da norma se extraem diversos direitos fundamentais, i.e., várias dimensões do direito ao ambiente (sobre o direito fundamental como um todo, JORGE REIS NOVAIS, As Restrições aos Direitos Fundamentais não Expressamente Autorizadas pela Constituição…, 2º ed, 2010, pp. 128-133).

31º
Uma dessas dimensões traduz-se no direito à protecção (ROBERT ALEXY, apud JOSÉ DE MELO ALEXANDRINO, A Estruturação do Sistema de Direitos, Liberdades e Garantias na Constituição Portuguesa, 2006, Vol. II, p. 208, nota 864), protecção que cabe ao Estado, ao qual cumpre defender o direito ao ambiente contra actos lesivos de terceiros.

32º
A doutrina tem considerado que o direito à protecção é um direito social, já que o seu conteúdo não está determinado a nível constitucional (JORGE MIRANDA, Manual de Direito Constitucional, IV, 3ª ed, 2000, p. 541; J. J. GOMES CANOTILHO, “O direito ao ambiente como direito subjectivo, Estudos sobre Direitos Fundamentais, 20008, pp. 187-189, VASCO PEREIRA DA SILVA, Verde Cor de Direito, 2002, p. 103) e, consequentemente, não podem os particulares exigir em tribunal, ao seu abrigo, uma determinada conduta aos entes públicos.

33º
VIEIRA DE ANDRADE considera mesmo não estarmos perante um direito fundamental, mas antes perante uma dimensão objectiva do direito ao ambiente, dimensão essa que impõe deveres de actuação às entidades públicas, mas que não cria qualquer direito subjectivo na esfera jurídica dos particulares (Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, 5º ed, 2012, pp. 137 ss.).

34º
Assim, para este A., os particulares só poderiam invocar directamente o direito à protecção se fosse violado o “mínimo existencial ecológico” (CARLA AMADO GOMES, Risco e modificação…, p. 75), caso em que haveria uma “ressubjectivação da dimensão objectiva” (VIEIRA DE ANDRADE, ob. cit., pp. 146-147).

35º
De facto, o entendimento pela impossibilidade de invocação do direito à protecção é sustentável, dado que a nossa Lei Fundamental não determina a que medidas de protecção está o Estado obrigado a prosseguir para tal protecção. Contudo, e apesar de não haver um direito originário a essa prestação, verifica-se que existem direitos derivados à prestação, os quais se concretizam através de lei (JORGE REIS NOVAIS, Direitos Sociais, 2010, pp. 155 ss.), e que, in casu, consistem em medidas de fiscalização, como concretizaremos adiante.

36º
Sem enveredar pelo problema da articulação desses direitos de fonte legal com “verdadeiro” direito fundamental, nomeadamente sabendo se aqueles direitos beneficiam do regime deste, a verdade é que o particular pode sempre exigir a actuação dos entes públicos, dado que possui um direito subjectivo criado ex lege.


b)     O regime geral da gestão de resíduos

37º
A gestão de resíduos encontra-se regulada no Decreto-Lei nº 178/2006, de 5 de Setembro, o qual transpôs para o nosso ordenamento  as Directivas nº 2006/12/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril, e nº 91/689/CEE, do Conselho, de 12 de Dezembro.

38º
Neste diploma consagram-se os diversos princípios aplicáveis aos serviços de gestão (arts. 4º a 10º), assim como também os termos do seu planeamento e ainda as normas técnicas aplicáveis, entre outros.


c)      Da concessão de serviços públicos

39º
A gestão de RSU das áreas municipais é uma atribuição dos munícipios, nos termos dos arts. 13º, nº 1, alínea l), e 26º, nº 1, alínea c),  da Lei nº 159/99, de 14 de Setembro.

40º
A gestão dos serviços municipais de gestão dos resíduos sólidos pode, no entanto, ser delegada em entidades privadas, através da concessão do serviço, como determina o Decreto-Lei nº 194/2009, de 20 de Agosto, no seu artigo 7º, nº1, alínea d). 

41º
Tal sucedeu, no nosso caso, pela celebração do contrato com a Sociedade Lislixo S.A., em 2009.

42º
De facto, o contrato celebrado entre a Sociedade Lislixo, S.A. e o Município de Lisboa qualifica-se como um contrato administrativo de concessão de serviço público, pois define-se por “o Estado conferir temporariamente, a uma entidade privada, os poderes bastantes para explorar um serviço público, sob fiscalização do concedente, durante o prazo estipulado, incluindo os investimentos necessários para a sua manutenção. A entidade concessionária actua por sua conta e risco, como se fora o concedente, sendo renumerada por meio de taxas ou tarifas a pagar pelos utentes ou consumidores do respectivo serviço público” (FERNANDA MAÇÃS, “A concessão de serviços públicos e o Código dos Contratos Públicos, Estudos de Contratação Pública, 2008, pp. 379-380).

43º
Embora o concessionário actue por sua conta e risco, esta assumpção não é total, como reitera PEDRO GONÇALVES, já que “a concessão é uma técnica de repartição de responsabilidades administrativas (…) deixa na Administração o controlo ou fiscalização dessa gestão ou exercício” (A Concessão de Servições Públicos, 1999, p. 246).

44º
Esta repartição de competências impõe que o concedente fiscalize o funcionamento do serviço, e que lhe seja vedada a possibilidade de “renunciar à faculdade de regulamentar e de inspeccionar o funcionamento do serviço” (MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, II, 9º ed, 1983, p. 1109), incumbindo ao concedente “superintender na fiscalização da observância das disposições regulamentares” (MARCELLO CAETANO, ob. cit., p. 1110).

45º
Além do dever de regulamentar a actividade que cabe ao concedente, o regime jurídico aplicável às concessões de serviços públicos confere ao concessionário o direito à exclusividade do serviço público, i.e., só a ele é permitido juridicamente o exercício daquela actividade na área definida (vd. art. 415º, alínea a) do CCP).

46º
A este direito do concessionário opõe-se o dever do concedente de não permitir a concorrência de terceiros. Desta forma, “(…) se a concorrência surgir ilegalmente é ainda ao concedente que cumpre empregar os meios de polícia necessários para fazer cessar a ilegalidade e reprimir esta criminalidade, ficando igualmente responsável, se o não fizer, pelos danos deccorentes da sua inacção” (MARCELLO CAETANO, ob. cit., p. 1099).

47º
Este sector de actividade está disciplinado no Regulamento Municipal (Deliberação 523/CM/2004, de 28 de Julho de 2004), dispondo-se no art.º 21.º que “À excepção da Câmara Municipal de Lisboa e de outras entidades, públicas ou privadas, devidamente autorizadas para o efeito, é proibido a qualquer outra entidade o exercício de quaisquer actividades de remoção de RSU”, preceito cuja violação implica, nos termos do art.º 41.º do mesmo diploma, responsabilidade contra-ordenacional.

48º
No mesmo sentido vai, aliás, o Decreto-Lei nº 178/2006, de 5 de Setembro (que aprova o regime geral aplicável à prevenção, produção e gestão de resíduos), ao determinar a proibição de exercício não licenciado de gestão de resíduos (art. 23º), a qual, sendo violada, implica responsabilidade contra-ordenacional (art. 67º, nº!, alínea b)).

49º

Nos termos do DL nº 178/2006, cabe ao munícipio, entre outros, a fiscalização do seu cumprimento (art. 66º).

50º
Como já demonstrámos, também a observância das disposisões regulamentares cabe ao concedente (o Município), o que não tem sucedido, dado que não têm sido realizadas quaisquer acções de fiscalização por parte deste.

51º
Assim, além da violação desse imperativo de “fazer cumprir” o regulamento administrativo que regula esse sector de actividade, o concedente tem violado o direito à exclusividade da concessionária, pois não tem prevenido nem reprimido as actuações ilícitas de terceiros, actuações que têm causado prejuízos àquela.


d)     Da ERSAR
52º
A ERSAR, I.P., foi criada pelo Decreto-Lei nº 277/2009 (ao qual nos referiremos daqui em diante), de 2 de Outubro, que aprova o seu estatuto orgânico. Qualifica-se como um instituto público, dotado de autonomia administrativa e financeira, assim como de património próprio, e prossegue as atribuições do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, sob a tutela do respectivo ministro (artigo 1º).

53º
A sua missão passa pela “regulação dos sectores dos serviços de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestão de resíduos urbanos e o exercício de funções de autoridade competente para a coordenação e fiscalização da água para consumo humano” (artigo 3º).

54º
Entre as suas atribuições (artigo 5º) encontramos, na alínea b) do número 2: “Assegurar a protecção dos direitos e interesses dos utilizadores, salvaguardar a viabilidade económica das entidades gestoras, incentivar a consolidação do tecido empresarial e contribuir para a protecção do ambiente e dos recursos naturais”.

55º
Parece-nos, pois, por demais evidente, que tais atribuições só podem ser prosseguidas, in casu, com o recurso a acções de fiscalização sobre o cumprimento das normas que regulam a matéria, i.e., entre outros, o regulamento de resíduos sólidos da cidade de Lisboa já referido, nomeadamente, no cumprimento do disposto nos seus artigos 21º e 49º.

56º
É, aliás, esse o entendimento que resulta da interpretação sistemática da alínea b) do nº 2, do art. 5º, nomeadamente com os  art. 5º, nº 1, alínea c) e nº 2, alínea a), d) e j) do mesmo diploma.

57º
De facto, é neste sentido que se dirige a Proposta de Lei nº 125/XII de 10 de Janeiro de 2013 (publicada no Diário da República, II, série A, nº 61), onde se prevê expressamente, no artigo 11º, poderes para “processar as contraordenações e aplicar as coimas correspondentes e ainda as demais sanções aplicáveis às infrações das leis e regulamentos cuja implementação ou supervisão lhe esteja cometida, bem como as resultantes do incumprimento das suas próprias determinações, nos termos previstos na lei.”

58º
Assim, apesar de ainda não ser expressa a sua menção na legislação actual, entendemos que só reconhecendo estes poderes à ERSAR se pode garantir efectividade às atribuições referidas (artigo 5º, nº2, alínea b), as quais permitem, no nosso caso, a tutela das situações de desrespeito por normas reguladoras do sector.

e)     A IGAMAOT
59º
Relativamente à IGMAOT, destaca-se, enquanto uma das suas áreas de intervenção, o controlo e inspecção das actividades com incidência ambiental.

60º
Exercendo uma função de controlo, auditoria e fiscalização e sendo dotado de autonomia administrativa, sob a tutela do MAMAOT, competem-lhe, entre outras, as atribuições referidas no artigo 2.º, nº 2 a), f), g), h), e i) do DL 23/2012 e no artigo 11º nº2 f) do DL 7/2012, de 17 de Janeiro.

61º
Daqui se retira que a IGMAOT deverá proceder a auditorias, inspecções, e outras acções de controlo, exercendo funções próprias de órgão de polícia criminal em matérias de incidência ambiental, devendo, ainda, instaurar, instruir e decidir os processos de contraordenação ambiental, impondo as medidas que previnam ou eliminem situações de perigo grave para a saúde, segurança das pessoas, dos bens e do ambiente.

62º
Assim, como referimos acima, não cabe à Sociedade Lislixo, S.A., nos termos do contrato,  a função fiscalizadora e preventiva, pelo que a eficácia das normas do Regulamento supra referido deveria ser assegurada pelas entidades mencionadas, i.e., o Município de Lisboa, a ERSAR e a IGAMAOT.


f)       Da participação da Associação Ambientalista Verdetotal

63º
No que concerne à intervenção da «Associação Ambientalista Verdetotal», destaca-se que o supra referido artigo 52º nº3 da CRP, relativo à legitimidade desta, consagra o direito de acção popular para defesa de valores e bens constitucionalmente protegidos, enquanto direito fundamental de participação política.

64º
Na verdade, “uma acção popular ao serviço do ambiente deve conceder a todos (particulares e associações ou fundações de defesa do ambiente) o direito de acesso aos tribunais para a sua defesa, nos termos que a Constituição portuguesa consagra.”(JOSÉ LEBRE DE FREITAS, “A acção popular ao serviço do ambiente” in Ab Vno Ad Omnes, 75 anos Coimbra editora, p. 809).

65º
A legitimidade da «Associação Ambientalista Verdetotal» parece decorrer igualmente do art 9º nº2 CPTA, que determina, “para os casos aí previstos, a extensão da legitimidade processual a quem não alegue ser parte numa relação material que se proponha submeter à apreciação do tribunal” (MÁRIO AROSO ALMEIDA, Manual de Processo Administrativo, 2010, p. 225).

66º
Deste modo, “as associações que actuam em defesa dos interesses colectivos e difusos fazem valer uma legitimidade originária específica quando propõem acções para tutela de tais interesses (...)”, podendo, consequentemente, “(...) uma associação e particulares interessados mover conjuntamente acções de tutela de interesses colectivos e difusos (...)” (JOSÉ LEBRE DE FREITAS, ob. cit., p. 802).

67º
Por outro lado, encontram-se preenchidos os requisitos previstos no art. 3º da Lei nº 83/95: a «Associação Ambientalista Verdetotal» tem personalidade jurídica, visa a protecção do ambiente e da saúde pública e não exerce qualquer tipo de actividade concorrente com empresas ou profissionais liberais.

68º
Assim, encontra-se assegurado o respeito pelo princípio da especialidade, uma vez que está em causa um bem ou interesse cuja defesa se inclui expressamente no âmbito das atribuições da associação referida.

69º
Acresce, ainda, que a «Associação Ambientalista Verdetotal» constitui uma Organização Não Governamental de Ambiente (ONGA), de acordo com o art. 2º nº1 da Lei nº 35/98 de 18 de Julho.

70º
Esta ONGA beneficia, conforme o art. 3º da Lei 35/98 de 18 de Julho, do respectivo estatuto, uma vez que se encontra inscrita no Registo Nacional das Organizações Não Governamentais de Ambiente e equiparadas, organizado pelo Instituto do Ambiente, nos termos da Lei nº 35/98, de 18 de Julho e da Portaria nº 478/99, de 29 de Junho, alterada pela Portaria nº 71/2003, de 20 de Janeiro e pela Portaria 771/2009 de 20 de Julho (Doc. ANEXO 10).

71º
Para além disso, a «Associação Verdetotal» constitui uma ONGA de âmbito local, nos termos do art 7º nº 3 c) da Lei nº 35/98 de 18 de Julho, visto que desenvolve, com carácter regular e permanente, actividades de interesse ou alcance geográfico municipal ou inframunicipal e que tem mais de 100 associados. 

72º
Verifica-se, desta forma, uma adequação no que respeita ao âmbito geográfico desta associação: constituindo uma ONGA de âmbito local, a nível do Município de Lisboa, considera-se a sua legitimidade, visto que a lesão do ambiente e da saúde pública se verifica, neste caso, no município referido.

73º
Assim, constata-se o respeito pelo princípio da territorialidade, visto que o direito de acção não só se encontra “circunscrito à área da intervenção principal” da associação (ambiente), como também está em conformidade com a “respectiva incidência geográfica, que poderá ser de âmbito nacional, regional ou local.” (MÁRIO AROSO ALMEIDA, ob. cit., p. 226).

74º
A exigência desta adequação assenta na consideração de que “(...) a personalidade colectiva é uma personalidade criada em atenção a objectivos estatutários determinados. Se a acção extravasar este âmbito, a associação não pode actuar – porque ela própria se auto-limitou na sua capacidade de actuação.” (CARLA AMADO GOMES, Não pergunte o que o ambiente pode fazer por si; pergunte-se o que pode fazer pelo ambiente! Reflexões breves sobre a acção pública e a acção popular na defesa do ambiente”, Estudos de Direito do Ambinete, Vol. III, p. 222).

IV- Do pedido

75º
Atendendo aos elementos acima descritos e referidos vêm os AA. pedir a condenção dos RR. na adopção de comportamentos, designadamente, de acções de fiscalização e prevenção das violações das normas regulamentares que acima se mencionam, bem como da violação do direito à exclusividade conferido à Sociedade Lislixo, S.A..

76º
Estas acções consubstanciam operações materiais administrativas visto que a sua “vocação única é a produção de efeitos de facto” podendo definir-se como “conjunto de actos que visam exclusivamente produzir alterações na realidade física, praticados por entidades que desenvolvem a função administrativa, no âmbito da prossecução dos seus objectivos de interesse público” (CARLA AMADO GOMES, As Operações Materiais Administrativas e o Direito do Ambiente, 2ª ed, 2005, p. 35)

77º
Deste modo fundamenta-se o pedido no disposto na alínea c) do número 2 do artigo 37º do CPTA, entre os processos que integram a acção comum administrativa, acção aplicável a todos os litígios que se insiram na jurisdição administrativa e que não sejam objecto de regulação especial (37º, número 1 CPTA), já que “esta via serve, tanto para a paralisação como para a propulsão da actividade material (ou seja, para vencer a inércia)” (CARLA AMADO GOMES, Ob. cit., p. 53)

V – DA PROVA
Prova Testemunhal:
-        Ana Prantelhana Vê Tudo, residente em Rua Pinheiro Chagas, 21A, 1050-175, Lisboa.
-        João Boa Guarda, residente em Rua Rodrigo da Fonseca, 105, 1070-239, Lisboa.

Valor da causa: €30.000,01 (34º, nº 1 e 2º do CPTA)

Junta: Procurações forenses, DUC, comprovativo de pagamento DUC, e 10 documentos anexos.

Lisboa, 20 de Abril de 2013


Os Advogados,

Daniel Bogalheiro
Diana Nunes
Inês Mateus
Isabel Ferreira
João Maltez
Luís Aragão
Marisa Silva
Miguel Vieira
Patrícia Domingos
Vera Martins


NOTA: Junto segue o link de download dos anexos e documentos relevantes.
                                                                                 


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