"Terminou no passado dia
16 de Abril a consulta pública do Estudo de Impacte Ambiental do projeto de
exploração mineira da Boa Fé, tendo as Associações de Defesa do Ambiente
signatárias manifestado a sua oposição à instalação de um complexo de
exploração de depósitos mineralizados auríferos numa área total de 99,56
hectares na freguesia de Nossa Senhora da Boa Fé, concelho de Évora, por esta
apresentar demasiados riscos ambientais para a região e para o país.
Acresce que, numa
altura em que se verifica uma descida acentuada do preço do ouro nos mercados
internacionais na ordem de 30%, depois de 12 anos consecutivos de subida deste metal precioso, e considerando a opinião da maioria dos especialistas de que a tendência será para que o valor continue a baixar nos próximos anos, os pressupostos
económicos que estiveram na base da viabilidade deste investimento estão longe
de estarem garantidos. O que está em causa
com este projeto é a instalação de uma indústria de exploração mineira, com
duas cortas de exploração a céu aberto – Casas Novas e Chaminé - ocupando, já
com as áreas necessárias às instalações e infraestruturas anexas mineiras,
99,56 hectares, dos quais uma escombreira de estéreis com 37 hectares para acondicionar
10 851 000 toneladas de estéreis e uma barragem de rejeitados com 32 hectares,
utilizada para reter 10 000 toneladas de metais pesados, nomeadamente arsénio,
chumbo, cobre, mercúrio inorgânico, níquel, prata e zinco, resultantes de 5
anos de laboração. São espaços que armazenam materiais que a própria legislação
considera resíduos perigosos, já que estão inseridos na categoria A, de acordo
com art.º 9.º do Dec.-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro.
As Organizações Não
Governamentais de Ambiente consideram que este é um processo que desde o seu
inicio, no ano de 2009, tem seguido uma agenda própria de contornos dúbios,em
que as entidades mais diretamente envolvidas neste processo, nomeadamente os Municípios de Évora e de Montemor-o-Novo e o ICNF – Instituto da Conservação da
Natureza e das Florestas cumpriram paulatina e diligentemente as aspirações do
proponente, alterando dos Planos Diretores Municipais e publicando o Plano de
Intervenção no Espaço Rural do Sítio de Monfurado, com o único objetivo de
favorecer a concessão da atividade mineira numa área em que a mesma estava
interdita por lei.Quer a alteração ao
PDM de Évora, quer a elaboração do Plano de Intervenção no Espaço Rural do
Sítio de Monfurado são autênticas farsas que demonstram como se podem desvirtuar instrumentos de ordenamento do território e planos de gestão de
Sítios de Importância Comunitária (SIC) classificados ao abrigo da Rede Natura
2000 para possibilitar o desenvolvimento de atividades económicas incompatíveis
com a conservação da natureza. No caso de Monfurado, este famigerado plano
permitiu que 11,3 da área do SIC se tornassem “Áreas de Exploração dos Recursos
Geológicos”, pondo em causa a integridade desta área classificada. Esta é mais
uma situação reveladora de uma permissividade sem limites que só pode resultar
da submissão dos agentes da Administração Pública e dos decisores políticos aos
interesses imediatos do poder económico, prejudicando o bem público e a
sustentabilidade dos recursos naturais, uma situação que se tem vindo a agravar nos últimos anos.
Relativamente aos riscos ambientais associados ao projeto, alguns que
perdurarão por muitos anos após a conclusão da fase de exploração, podem
ser sintetizados da seguinte forma:
- Não existem garantias de que a altura do paredão impeça a passagem de águas contaminadas para jusante, como tem demonstrado o histórico de acidentes graves com minas a céu aberto, e qualquer intervenção de remediação após acidente, mesmo com recursos às mais recentes tecnologias, proporcionará resultados de duvidosa eficácia;
- O estudo de impacto ambiental preconiza que a responsabilidade da empresa cesse com o fim da exploração, cabendo a entidades terceiras, provavelmente estatais, o ónus da manutenção destes depósitos contaminados e a intervenção em caso de acidente com elevados riscos para os ecossistemas e saúde pública, pois o passivo ambiental associado às escombreiras e à barragem de retenção manter-se-á por décadas com elevado risco para o ambiente e para a saúde pública, devido à verdadeira “bomba-relógio” de arsénio, chumbo, cobre, mercúrio inorgânico, níquel, prata e zinco, cuja disseminação pode vir a ter consequências imprevisíveis;
- Serão destruídas áreas de habitat de sobreiros e azinheiras, estando previsto o abate de 6952 árvores adultas;
- O projeto causará impactes sobre as populações das imediações, com o ruído da detonação de 340 toneladas de explosivos/ano e a emissão constante de poeiras;
- O projeto afetará diretamente o Sítio de Importância Comunitária “Serra de Monfurado” da Rede Natura 2000
Deste modo, as
Associações signatárias consideram que as incertezas próprias das flutuações da
cotação do ouro nos mercados internacionais e a falta de garantia da assunção
dos riscos e custos associados à implementação de todas as medidas previstas
para a requalificação da área, bem como para a prevenção, monitorização e
controlo de eventuais situações de acidentes futuros, demonstram que se trata
de uma iniciativa arriscada que só poderá vir a trazer, como o histórico da
atividade mineira em Portugal tem comprovado, mais custos para os contribuintes
num futuro próximo. A crise económica que o país atravessa não deve ser motivo
para deixarmos de ser exigentes com a preservação do Ambiente e apostarmos em
atividades económicas compatíveis com a conservação dos recursos naturais
renováveis, o que certamente não é o caso deste tipo de projetos com grandes
riscos e impactes muito consideráveis no património natural do País."
*Escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico
FAPAS, LPN e Quercus (19-04-2013)
Catarina Baltazar, 19544
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