quinta-feira, 28 de março de 2013

Um breve “olhar” sobre as Energias Renováveis


Um breve “olhar” sobre as Energias Renováveis



Alternativas energéticas será sinónimo de energias renováveis?

            Antes demais cabe esclarecer que, quando se fala de energias renováveis aponta-se para a produção de energia a partir de recursos naturais regeneráveis, ou seja, tendencialmente inesgotáveis, quando se utiliza o termo “alternativas”, por exemplo, ao petróleo, estamos a ter em conta a vertente económica e a vertente politica.
Posto isto, a Prof. Carla Amado Gomes, entende que, alternativas energéticas e energias renováveis não são inteiramente coincidentes, desde logo porque há alternativas energéticas que não têm suporte em recursos renováveis, ou seja, trata-se da produção de energia como alternativa ao petróleo, mas que não utiliza recursos renováveis. Como exemplo desta realidade temos a co-geração de energia a partir da combustão de gás natural, (a jeito de clarificar, a co-geração é a produção combinada e simultânea de calor e electricidade numa mesma instalação industrial. Com esta técnica o operador pode autoproduzir electricidade e energia térmica a partir de um único combustível, que pode ser esgotável, como o gás natural, ou renovável, através da utilização de resíduos industriais e urbanos), recurso que se encontra melhor distribuído no globo do que o petróleo e que gera um índice substancialmente menor de emissões de dióxido de carbono. No entanto trata-se de uma fonte que se pode esgotar, tal como as reservas petrolíferas, e por isso não pode ser tratado como uma alternativa, mas apenas como um balão de oxigénio até à descoberta de outra solução. Uma outra alternativa ao petróleo é o carvão. As suas expectativas de esgotamento ultrapassam os 200 anos e encontra-se muito mais equitativamente distribuído pelo planeta do que o petróleo ou o gás natural oferecendo ainda mais garantias de segurança e de abastecimento. No entanto o facto de ser altamente poluente e de ser contrario as normas de Quioto, faz com que seja uma alternativa a evitar, a não ser que se transforme o carvão em carvão liquefeito (carvão limpo), técnica já utilizada na China e em alguns Estados europeus, que minimiza as emissões.
Um outro factor que faz com que alternativas energéticas e energias renováveis não sejam sinónimos é, por outro lado, o facto de existirem fontes de energia renovável que não constituem uma verdadeira alternativa e porquê? Porque, a produção de energia através de recursos naturais renováveis implica a criação de novas tecnologias de captação e de transformação, e isto é oneroso, não só pela investigação que a precede, como devido à sofisticada implementação que a sua concretização pressupõe. Estas necessidades justificam que nem toda a possibilidade de aproveitamento de recursos renováveis para produção de energia são economicamente viáveis, isto é, que constituem uma real alternativa. É por isso que, a avaliação da viabilidade deve ser realizada calculando os benefícios no médio e longo prazo e não apenas num período de vida de um dado Governo. Constituem alguns obstáculos para a adopção de novas alternativas energéticas: a importação de novas tecnologias; a sensibilização da população para a conveniência da alteração dos hábitos de consumo energético; a resistência à mudança; o desconhecimento de esquemas de financiamento; a falta de técnicos preparados para montar e manter centrais de energias renováveis, etc..

O interesse pelas energias renováveis

Foi a  “Revolução Ecológica” do final do Século XX que despertou os Estados e operadores económicos para a necessidade de apostar em novas fontes de energia. Isto resulta não apenas do receio da interrupção do abastecimento de petróleo, desencadeado pela crise de 1973, mas sobretudo pela consciência da finitude das reservas petrolíferas, o que fez com que muitos Estados começassem a procurar outras fontes de produção de energia. O súbito interesse pela questão energética prende-se com a tentativa de se encontrar alternativas e criar soluções de independência dos Estados face aos factores externos.
            Amory Lovins (físico norte-americano), na sua obra “The Energetic Controvercy” , propunha duas vias para se ultrapassar a crise energética de 1973, a maneira mais difícil era o recurso incontrolado aos combustíveis fosseis e à energia nuclear, e a maneira mais simples era o aproveitamento racional dos recursos energéticos, ou seja, das fontes de energia renovável.
Logo na Declaração de Estocolmo, de 1972 os Estados afirmaram no seu Principio 3, que “A capacidade do Globo de produzir recursos renováveis essenciais deve ser mantida e, sempre que praticável, restaurada ou melhorada”. Vinte anos depois, 1992, na Declaração do Rio, ficou assente no Principio 7 que, e passo a citar na integra, Os Estados irão cooperar, em espírito de parceria global, para a conservação, protecção e restauração da saúde e da integridade do ecossistema terrestre. Considerando as diversas contribuições para a degradação do meio ambiente global, os Estados têm responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Os países desenvolvidos reconhecem a responsabilidade que lhes cabe na busca internacional do desenvolvimento sustentável, tendo em vista as pressões exercidas por suas sociedades sobre o meio ambiente global e as tecnologias e recursos financeiros que controlam. Ora podemos ver então que o Principio 7 realçava a necessidade da cooperação internacional no sentido da conservação, protecção e restauração da qualidade dos ecossistemas terrestres,  segundo um principio de responsabilidade comuns, mas diferenciadas, de acordo com o nível de desenvolvimento de cada Estado.
Apesar das várias discussões a cerca da produção de energia através de fontes renováveis, foi sem dúvida o Protocolo de Quioto, de 1997, que impulsionou o tema da produção de energia a partir de fontes renováveis, em virtude de se reduzir a utilização de combustíveis fosseis, e consequentemente a dependência externa dos Estados.

Mas, serão as energias renováveis nocivas para o meio ambiente?

            Claro que a resposta a essa pergunta se afirma positiva, seria impensável levar a cabo um conjunto de actividades com a pretensão de deixar o meio natural intocado e imaculado. O importante é que a ofensa ao meio natural se reduza ao mínimo indispensável.
É verdade que os bens ambientais estão sujeitos ao principio do aproveitamento racional, no entanto é necessário ter cuidado para que da utilização das fontes de energia renováveis não resultem danos graves, nem para o bem utilizado, nem para outros bens, por isso, torna-se necessário avaliar, com base nos conhecimentos científicos disponíveis, quais as implicações da adopção de novas técnicas de aproveitamento das energias renováveis e evitar ou minimizar os seus impactos negativos sobre outros bens naturais e humanos.
            Temos por exemplo, em Portugal, a co-geração de energia a partir de resíduos industriais perigosos. Apesar do crescimento da eficiência energética das cimenteiras onde se planeava a sua implementação e da queima de resíduos perigosos ser feita a céu aberto, a opção tem sido alvo de contestação por parte das populações vizinhas das cimenteiras, por parte da associação de defesa do ambiente e de responsáveis políticos locais, invocando o “principio da precaução”. Depois de ter sido travada em 1999 por intervenção da Assembleia da República; autorizada em 2000 com base num relatório da Comissão Cientifica Independente, criada para estudar os riscos da sua implementação; enfrente agora um obstáculo judicial.
Com efeito, a 24 de Novembro de 2006 (proc. 758/06.3BECBR) o TAF de Coimbra deferiu uma providência cautelar solicitada pelo Município de Coimbra no sentido de suspender  a autorização de co-incineração de resíduos industriais perigosos na cimenteira de Souselas com base no principio da precaução. O TCA Norte confirmou esta decisão, alegando haver um facto notório da perigosidade da operação de co-incineração. Mas o STA através do Acórdão de 31 de Outubro de 2007 (proc. 0471/07) pôs fim a esta intervenção, denegando o direito à tutela neste caso.

As energias renováveis na Constituição da República Portuguesa

            Nesta matéria os artigos importantes são o 81º/ m) respeitante às incumbências prioritárias do Estado e o artigo 66º que consagra a tarefa estadual de protecção do ambiente.
Na alínea m) do artigo 81º do diploma fundamental prevê-se expressamente a adopção de uma politica nacional de energia mas tendo em conta a preservação dos recursos naturais e do equilíbrio ecológico. Será necessário no entanto estabelecer uma ligação entre este preceito e as alíneas a), c), d), f), g) e j) do nº2 do artigo 66º.
Na alínea f) do artigo supra referida está consagrado o principio da integração e subjacente a este principio está a necessidade de protecção do ambiente. Já na alínea d) podemos ver que os recursos naturais susceptíveis de aproveitamento com vista à geração de energia devem ser alvo de medidas de racionalização, principalmente quando não regeneráveis. Na alínea g) está consagrada a educação ambiental, isto significa que, nenhuma politica de ambiente ou qualquer outra que tenha como objectivo a protecção do ambiente ganha efectividade sem a necessária consciencialização dos cidadãos para a sua importância.
Como já foi referido a produção de energia através de recursos renováveis torna-se por vezes dispendiosa, devido aos elevados custos de instalação e dos encargos com a ligação à rede, por isso torna-se necessário instituir mecanismos de competitividade ao nível dos preços, no confronto com as energias tradicionais, é por isso que na alínea h) se refere a politica fiscal e a politica de protecção do ambiente. As alíneas a) e c) surgem porque o aproveitamento das energias renováveis podem lesar outros valores ecologicamente relevantes, tornando-se necessário conciliar a produção de energia com a salvaguarda de outros bens naturais. Demos alguns exemplos, as centrais geotérmicas podem provocar poluição, na medida em que a água liberte gases como o metano e o hidrogénio sulfuroso; os parque eólicos constituem risco para a sobrevivência de certas aves migratórias; a plantação de espécies geradores de biocombustiveis obriga a desalojar outras culturas. É por essas razões que a CRP no seu artigo 66º determina uma ponderação de interesses, ambientalmente relevantes e outros, como pressuposto de legitimação de medidas ou actividades lesivas de bens ambientais, especialmente bens não regeneráveis.
Para concluir esse ponto cito os Profs. Gomes Canotilho e Vital Moreira que afirmam que, “A imposição constitucional de uma politica nacional de energia é tanto mais justificável quanto a energia não é somente um recurso essencial para a economia e para o bem estar individual e colectivo (bem como para a segurança nacional), tendo a ver com a preservação dos recursos naturais numa óptica de desenvolvimento sustentável, como também é essencial para a preservação do ambiente, dados os efeitos nefastos das fontes fosseis de energia (carvão, petróleo), principalmente sobre o ar e o aquecimento climático”.

O Decreto-Lei 189/88 de 27 de Maio e suas alterações em linhas gerais

            Neste diploma o legislador pretendeu “reunir num só diploma todo o quadro legal referente à actividade (de produção de energia eléctrica em pequena escala), garantindo a sua coerência interna e tornando-se mais transparente para os agentes económicos envolvidos”. (lê-se no ponto 5 do Preâmbulo). No diploma referido é-nos apresentado a figura do pequeno produtor/produtor em regime especial (pessoa singular ou colectiva, pública ou privada), como o produtor de energia eléctrica a partir de fontes renováveis desde que o estabelecimento industrial de produção no seu conjunto, não ultrapasse a potencia aparente instalada de 10.000kVA previsto no seu artigo 1º. Os pequenos produtores podiam optar por comercializar e consumir – artigo 10º/11 – a energia produzida em rede própria ou ligar-se à rede. Prevê-se ainda no diploma um procedimento de licenciamento para o caso dos produtores em regime especial (vide por exemplo artigo 19º; 20º; 25º e 27º).
            Nos termos deste diploma os produtores em regime especial fruíam de dois tipos de apoios: por um lado, a energia produzida gozava de um preço especial, traduzido num encargo adicional à factura suportado pelo Estado, como se lê no artigo 22º/5 e por outro, de uma garantia de receita calculada em função da energia fornecida, durante os primeiros 8 anos do prazo de amortização do investimento (artigo 23º/1).

            Em 1995, o legislador adoptou um conjunto de diplomas (Decretos-Lei 182 a 188/95, de 27 de Julho) que divide o sistema eléctrico em Sistema Eléctrico Nacional (SEN) e Sistema Eléctrico Independente (SEI), de modo a reforçar a abertura do sector eléctrico à iniciativa privada. Os produtores em regime especial (artigo 18º do Decreto-Lei 29/06, de 15 de Fevereiro) forem integrados no SEI e considerados intervenientes no SEN [artigo 14º/a) do DL 29/06] , sujeitando-os às obrigações de serviço público, de respeito pelo ambiente e de acatamento de medidas de salvaguarda decretadas pelo Governo em caso de crise energética (cfr. artigos 5º; 6º; 7º do DL 29/06).
           
            No mesmo ano, o legislador decidiu fazer algumas alteração ao DL 189/88, através do DL 313/95, de 24 de Novembro com a finalidade de estabelecer, no âmbito do SEI, o regime jurídico do exercício da actividade de produção de energia eléctrica em aproveitamentos hidroeléctricos até 10MVA de potência aparente instalada , bem como o da produção de energia eléctrica a partir de energias renováveis, com excepção da hidráulica. De todas as alteração a mais importante será a retirada da co-geração do produtor em regime especial.

            Com o DL 168/99, de 18 de Maio, veio-se clarificar alguns pontos do regime do DL 189/88, tais como: a referência a “combustíveis nacionais” saiu da definição do produtor em regime especial (artigo 1º/1 DL 168/99); as instalações hidroeléctricas passaram a estar sujeitas a uma obtenção previa de uma licença de utilização de água; o procedimento de autorização das centrais produtoras passa a compor-se em três fases (atribuição do ponto de ligação, pedido de autorização da instalação e o pedido de licença de exploração) e com a revogação do artigo 26º do DL 189/88 desaparece a possibilidade de fornecimento de energia pelos produtores em regime especial a redes independentes.
            Com o DL 312/01, de 10 de Dezembro, alterou-se sensivelmente o regime da produção e entrega de energia eléctrica a partir de fontes renováveis à rede nacional. O diploma quis disciplinar o planeamento e crescimento das redes do SEP, fazendo suportar certos custos pelo operador de rede e aperfeiçoar o procedimento de atribuição do ponto de recepção, sujeitando-a, nomeadamente, a um pré-procedimento traduzido num pedido de informação previa, e vincando a necessidade de ponderação da sua existência no procedimento de avaliação de impacto ambiental prévio à concessão das autorizações essenciais á entrada em funcionamento da central produtora.

            A 29 de Dezembro de 2001, o DL 189/88 voltou a sofrer alteração agora pelo DL 339-C/01. Essas alterações circunscreveram-se à modificação do procedimento de atribuição da licença de exploração relativamente aos aproveitamentos hidroeléctricos; à modificação dos métodos de determinação do preço da electricidade vendida pelos produtores em regime especial às redes do SEP; à diferenciação do valor a atribuir a um novo coeficiente “Z” em função do tipo de energia renovável em questão (eólica, hídrica, ondas, solar fotovoltaica, etc..) e à criação de uma renda de 2,5% sobre o volume mensal de vendas à rede a pagar pelos parques eólicos aos Municípios onde se encontram instalados. E ainda verificou-se uma alteração significativa, a substituição do nº 18 do Anexo II do DL 189/88 por uma disposição da qual consta a diferenciação entre os vários tipos de energias renováveis para efeitos de calculo de preços de venda, (e consequente revogação dos nºs 19, 20, 21 e 22 do mesmo Anexo II). Ora o legislador ao fazer isso, suprimiu não só a norma que fixava um prazo mínimo de validade da autorização de exploração, como o critério de valorização degressiva do preço das energias renováveis em face das energias tradicionais.
Mas essa substituição acarretou alguns problemas que foram mais tarde supridos pelo DL 33-A/05 de 16 de Fevereiro que substituiu muito substancialmente o Anexo II, em matérias como a fixação do período máximo de regime preferencial de remuneração de electricidade entregue à rede, a introdução de incentivos ao desenvolvimento  de novas tecnologias de aproveitamento de energias renováveis, alargamento do prazo de caducidade do acto de atribuição do ponto de recepção, a possibilidade de se constituir um Tribunal Arbitral para determinar o valor a pagar pelos produtores em regime especial e os operadores de rede em virtude de obras de ligação à rede, sempre que o custo deva ser partilhado entre ambos...

            Com o DL 29/2006, de 15 de Fevereiro, o legislador voltou a reorganizar o sistema eléctrico nacional e apesar do diploma não tocar directamente no regime especial de produção de energia a partir das fontes renováveis, acaba por ser reflectir neste.

            Finalmente o DL 225/07, de 31 de Maio, reflectindo as preocupações do Governo veiculadas na Estratégia Nacional para a Energia (Resolução do CM 169/05), vai proceder à reformulação das fórmulas de cálculo do preço das energias renováveis, para que assim a sua produção se torne mais apetecível, vai aumentar o prazo de remuneração das centrais hídricas, apostar no desenvolvimento da energia eólica, clarifica os componentes procedimentais, nomeadamente na dimensão ambiental do procedimento autorizativo das centrais de energias renováveis, vai simplificar o  procedimento, tornando a decisão favorável ou condicionalmente favorável de avaliação de impacto ambiental desbloqueadoras de exigências procedimentais anteriores e criar um Observatório das Energias Renováveis com o objectivo de acompanhar e monitorizar a instalação e funcionamento dos centros electroprodutores de energias renováveis.

Conclusão

            Em jeito de conclusão Portugal em 2009, cumpriu 79% dos objectivos previstos no que respeita ao peso das fontes renováveis no consumo final de energia, sendo apenas superado pela Suécia, Finlândia e Áustria, e para cumprir a meta até 2020, de 31% da energia consumida ser de origem renovável, faltam apenas 6% de acordo com o documento do Ministério da Economia. Portugal é assim o 4º país da União Europeia, mais avançado no cumprimento das metas sobre peso das fontes renováveis no consumo final de energia. (noticia do DN de 17 Junho de 2012).

O AMBIENTE AGRADECE!


Vânia Ferreira
Nº 18448


Bibliografia

-       Declaração de Estocolmo;
-       Declaração do Rio;
-       GOMES, Carla Amado, “O regime jurídico da produção de electricidade a partir de fontes de energia renováveis: aspectos gerais” , 2009;
-       CANOTILHO, Gomes e MOREIRA, Vital, “Constituição da República Portuguesa Anotada” , 2007;
-       CRP;
-       DL 189/88, de 27 de Maio e posteriores alterações
-       http://www.dn.pt/inicio/economia/interior.aspx?content_id=2614086

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